domingo, 16 de julho de 2017

Estado da Nação...


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O estado é um substantivo masculino que deriva do latim Status. Já a expressão o “estado da nação” é quase como um pleonasmo porque normalmente se confunde o “estado” com a “nação” quando, na verdade, percebemos que a “nação” é o todo que inclui as partes. Já uma outra expressão “ao estado a que chegámos” remete-nos para a responsabilidade do “estado” em quase tudo o que de menos bom acontece.
Não querendo meter "a foice em seara alheia” permito-me fazer um comentário geral sobre o atual estado da nação, em particular, no que concerne ao desenvolvimento regional e no acreditar dos recursos endógenos dos territórios de interior e na forma como os podemos potenciar.
Nós temos a fileira dos vinhos como um exemplo paradigmático dessa capacidade e desse potencial. Acreditamos, estudamos e potenciamos os nossos recursos genéticos, designadamente as nossas castas, a capacidade empírica e tecnológica das nossas gentes e empresas que estamos a promover no mundo com uma estratégia de marketing forte e concertada. Tudo isto assenta numa identidade exclusiva do nosso património genético, na nossa cultura da vinha e do vinho que desenham a diversidade das paisagens e do enoturismo, neste “recanto à beira mar plantado”. É esta corrente que nasce no interior por entre vales e serras, florestas e pastagens que chega aos grandes centros de uma forma evoluída e personalizada para ajudar a promover o melhor que um País pode ter, a diversidade das suas culturas traduzidas em produção, sentimento, criatividade e inovação.
Outros sectores, como o da fileira dos queijos, deviam seguir este exemplo, mas para isso seria preciso um apoio mais efectivo e uma estratégia concertada, buscando sinergias e procurando deste modo a resolução de muitos dos seus problemas. A dinamização destes sectores poderiam contribuir igualmente para a sustentabilidade destes territórios, designadamente, através da prevenção dos incêndios nas florestas. Mas aqui rapidamente percebemos que, de uma forma genérica, as ações praticadas e a implementação dos programas e das estratégias do estado não vão ao encontro das necessidades nem daquilo que se apregoa. Na maioria dos casos quando o fazem é em prol de uns poucos através de estruturas que têm canais de acesso à informação e decisão privilegiadas. Não vamos voltar à conversa das “camas dos animais”, mas os animais são, sem qualquer sombra de dúvida, fundamentais para a salvaguarda, promoção e valorização do espaço rural e da floresta em particular. Os animais são os primeiros “sapadores da floresta”, sendo que não retiram mérito nem substituem os grupos de sapadores florestais que são fundamentais para o delineamento e execução de planos de prevenção. Estes são muitas vezes difíceis de justificar, porque não se tem a noção da estimativa do risco e a exata quantificação dos prejuízos no pós trauma.
Uma outra questão tem a ver com a valorização dos recursos da floresta, para que se possam ir retirando dividendos “palpáveis” ao longo dos anos. Aí, a inovação aliada ao setor técnico-científico tem um papel relevante a desempenhar, onde os Institutos Politécnicos em parceria com os principais Centros de Investigação e Desenvolvimento devem colaborar activamente. A proximidade geográfica e o conhecimento técnico e prático de uns e a capacidade científica e tecnológica de outros são uma simbiose estratégica fundamental que só pode redundar em êxito, através de uma escolha criteriosa de investigadores e dos respetivos consórcios.
O debate actual do Estado da Nação não pode fugir aos últimos e trágicos acontecimentos de Pedrógão Grande que “puseram a nu” algumas das fragilidades da atual política do desenvolvimento do interior pela qual eu não ponho as “mãos no fogo”. Obviamente que temos casos de sucesso, mas infelizmente são ainda poucos e “uma árvore não faz a floresta”.
Eu assisto à análise das candidaturas de projectos e vejo a falta de sensibilidade dos decisores, a reduzida massa crítica tecnicamente válida para ocupar cargos políticos neste interior e que normalmente se assumem como meras extensões das estratégias decididas na capital. E se por alguma vez quiserem ter um “rasgo de lucidez” para agitar um status quo, rapidamente moderam o ímpeto e colocam toda a veemência no vibrar da haste da bandeira que ostentam.
Para decidirmos o rumo destes territórios, precisamos conhecer muito bem a geografia e as suas gentes. Buscar identidades e diversidade para que os territórios no seu conjunto actuem em sinergia e de forma concertada, através de planos perfeitamente adaptados a cada realidade e que não se apliquem apenas estratégias replicadas e decalcadas. O País é pequeno em escala, mas contém uma diversidade paisagística, cultural e social que merece ser avaliada, valorizada e promovida com os tais empreendedores que muitas vezes fazem a diferença em absoluta consonância com as gentes que aí.
A estratégia tem que partir do cerne, mas para isso temos que eleger quem o conhece na sua essência e não pode ser vistos por “drone” como se todos tivessem floresta, rios, paisagens, artesanato, gastronomia e pessoas. A diferença está na cultura e nas gentes que os moldaram e que saberão seguramente os melhores caminhos para o seu sucesso futuro. Obviamente que não o fazem sozinhos, mas têm que ser os atores principais.
No pós Pedrógão Grande parece que o interior e as suas populações são um problema e que nada acrescentam a uma nação. O País ia tão bem embalado com um crescimento há muito não atingido, muito por força do turismo, e eis que de repente se abateu o demónio, com a “voz de uma trovoada seca”.
Este tipo de crescimento tem que ser analisado com o devido cuidado, para que não estejamos a acentuar uma dicotomia entre grandes centros e espaço rural. Obviamente que os atores do espaço rural têm que se afirmar, mas as regras e as oportunidade têm que ser claras e iguais para todos. Os produtores têm que fazer chegar os seus primores aos grandes centros e pelas vias certas. Talvez a melhor forma de os promover não seja pela mão dos chefs Michelin que palmilham quilómetros à busca de obterem os seus rendimentos e reconhecimento. Já temos exemplos e promessas bastas de ações e eventos, entre os quais o “Queijos à Chef” é um exemplo, que não almejaram atingir os propósitos a que se propuseram.
Uma das estratégias alternativas pode ser aproveitar o sucesso de algumas estruturas e empresas do interior que, fruto de muito trabalho e empreendedorismo, encontraram os canais certos de promoção e que hoje ganharam um capital e reconhecimento nos grandes centros que permitem abrir portas a outros que cumpram os mesmos requisitos de qualidade e que demonstrem essa vontade. O futuro passa por atrair visitas mas no imediato temos que ir onde está o turismo, tirar partido dos milhões de visitantes e ficarmos com o nosso "quinhão" para trazer para cá e redistribuir nos territórios de interior e o exemplo da Chocolateria Delícia pode ser um excelente "abre olhos", porque acredito poderem e quererem ajudar outros que tenham uma qualidade irrepreensível e o mereçam.
Paulo Barracosa

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